As falhas da caneta

Se a gente para pra pensar, a vida é cheia de momentos decepcionantes: tipo quando você está escrevendo e a caneta falha. Sabe aquele trabalho que você sempre quis e não veio? Aquele relacionamento que não rolou ou desandou? As mudanças repentinas de planos?

Pois é. Eu passava muito tempo tentando entender os motivos quando a caneta falhava até perceber que a lição não estava nisso e sim em pegar uma outra caneta e continuar escrevendo. É meio como um texto mesmo: se você não termina de escrever a frase até o ponto final, não vai ter como sacar o que ela queria dizer – e por mais louca que possa soar, algum sentido ela vai fazer.

Pra quem prestava medicina descobrir, com meio ano de cursinho, que não era esse o sonho é uma bela falha da caneta – e daí veio a publicidade. Dela surgiu o desejo de trabalhar naquelas agências grandes, e vou confessar uma coisa: a caneta falhou muitas vezes até eu chegar lá, definitivamente eu parecia estar indo no caminho oposto e acabei trabalhando na Y&R (não que tenha sido sem esforço, pelo contrário). Pois é, mas parece que a vida não estava contente e tinha que secar a tinta de novo, resultado: estou indo pra Londres estudar produção musical. Ah sim, e no meio disso tudo foi cada rabisco falso por conta de paixões e desilusões.

A verdade é que, no fundo, não daria pra viver sem as falhas da caneta porque a vida não é feita de traços contínuos e uma só cor. Se a caneta não falhar, não fazemos nenhuma curva nem trocamos do azul pro vermelho. E é por isso que hoje, a cada vez que a tinta seca, eu já nem penso duas vezes: vou até o ponto final pra ver no que dá.

*texto escrito em fevereiro de 2017